segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Retratos. Boemia. [ou Sobre um cretino IV]

Ele deu uma risada abafada e arrogante, o sorriso faiscando para a garota semi-nua à sua frente. Pegou um copo de uísque e virou um gole, deitando a cabeça para o lado para vê-la de um ângulo melhor.
- Me sinto especialmente atraído por strippers. Toda aquela história de “veja, mas não toque” me deixa especialmente muito excitado. – respondeu com seu tom mais natural e sem nenhum pudor.

Ela arregalou os olhos cor-de-mel, falseando uma surpresa. Abriu um pouco mais as pernas, ladeando-o com elas. Ele olhou e sentiu um arrepio subir na espinha.
- Ó. Devo me sentir lisonjeada por pertencer à categoria?

- Claro que sim! – o homem respondeu como se fosse óbvio, colocando outra nota de cem doláres na liga que ela tinha na perna. Que pernas, meu pai... – Strippers são meu feitiche desde que eu tenho 13 anos.

- Eu realmente imagino que você deveria ser mais um pobre e inocente garoto de 13 anos que olhava revistas pornôs e tocava uma no banheiro da escola. - a mulher se inclinou, segurando seu queixo delicadamente, com um sorriso zombeteiro no rosto.

- Isso foi aos 12. – ele sorriu automaticamente.

/ Liv.

Retratos. Sussurros.

Foi o som de um acorde. Violento. O rapaz ergueu a cabeça, olhando na direção da pesada porta de madeira e levantou-se da poltrona à frente da lareira de seu quarto. O que quer que estivesse fazendo não havia mais importância. Quieto, o rapaz se levantou e seguiu para fora do quarto. O violoncelo havia sido quebrado há anos... podia ainda se lembrar da briga.

Ao chegar no corredor, seus pés descalços e pálidos sentiram a frieza do piso de mármore. Havia uma fresta de luz... saindo da porta mais à frente. O quarto dela. O segredo dela. Uma fascinação, uma curiosidade, e também um desejo antigo remoeu-se dentro dele, insinuando-se quase polidamente... impeliram-no para frente.

Parou perto da porta, com uma das mãos apoiadas no vão da porta, ele inclinou-se apenas levemente para ver pela pequena abertura, de onde o som pesado e melodioso do violoncelo saía. Ele a viu. De olhos fechados, ela movimentava o arco sobre as cordas, os dedos rápidos e delicados produzindo as notas, e havia um leve contorcionismo no corpo dela, uma leve balançada como se a música lhe atingisse os músculos. Estava sentada, alvíssima, os cabelos longos e loiros pregados pelo suor em seus ombros, o vestido azul escuro mal lhe cobrindo as pernas. O violoncelo era negro e novo. Mais selvagem que o antigo.

A mulher abriu os olhos e encarou o rapaz diretamente. Os olhos azul cobalto também eram selvagens, reveladores, por um momento. Ele manteve-se quieto atrás da porta. O sorriso doce abriu-se em seus lábios. Um gesto tão incomum vindo dela. Aqueceu-o. Reconheceu o verdadeiro gênio da irmã naquele sorriso... era como um pequeno murmúrio, um “isso fica entre nós”. E com um leve aceno respeitoso, um sorriso quase imperceptível, ele assentiu, afastando-se dali.

/ Liv.