quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Retratos. Amores quebrados [ou Sobre um cretino V]]

Ele a observava dormir. Ali, deitada de bruços, com o lençol cobrindo-lhe apenas até os quadris, ela parecia em paz. O homem observou-a detalhadamente, seus olhos notando-lhe como a pele era clara (clara como marfim) e como a cor contrastava com vários sinais espalhados pelo corpo. Os cabelos escuros e curtos cobriam-lhe parte do rosto, a boca carnuda e rosada estava ligeiramente entreaberta, deixando uma respiração ritmada e tranquila sair. O homem esqueceu por um momento o tipo de situação em que estavam. Estendeu a mão para tocá-la apenas com as pontas dos dedos. Num primeiro momento, ela pareceu se incomodar, antes de relaxar sob o tato dele, sem acordar.

Sabia que ela não conseguiria evitá-lo por muito tempo. E não, não era presunção pensar aquilo. Haviam tentado aquilo antes, não? Mas sempre, irremediavelmente, um sempre acabava voltando para o outro. Não importava para onde o destino a levasse, ela sempre voltaria para ele. Sempre.

/Liv.

sábado, 12 de março de 2011

Enseadas.

Ela se encantou com o olhar dele. Cismada, fez com que ele arregalasse os olhos para observar bem de perto o mistério que a intrigava. Observou firmemente, estreitando um pouco os próprios olhos, tentando desvendar os dele, enquanto ele exibia aquele sorriso incerto sobre a sanidade mental dela. Durou três minutos. O ar de deslumbramento causado pela recém-descoberta envolveu-lhe o rosto. “Parece o mar, revolto, preso em um globo de vidro”, ela constatou. E, completou assim, meio ingênua: “É tão... lindo”.

/ Liv.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Retratos. Boemia. [ou Sobre um cretino IV]

Ele deu uma risada abafada e arrogante, o sorriso faiscando para a garota semi-nua à sua frente. Pegou um copo de uísque e virou um gole, deitando a cabeça para o lado para vê-la de um ângulo melhor.
- Me sinto especialmente atraído por strippers. Toda aquela história de “veja, mas não toque” me deixa especialmente muito excitado. – respondeu com seu tom mais natural e sem nenhum pudor.

Ela arregalou os olhos cor-de-mel, falseando uma surpresa. Abriu um pouco mais as pernas, ladeando-o com elas. Ele olhou e sentiu um arrepio subir na espinha.
- Ó. Devo me sentir lisonjeada por pertencer à categoria?

- Claro que sim! – o homem respondeu como se fosse óbvio, colocando outra nota de cem doláres na liga que ela tinha na perna. Que pernas, meu pai... – Strippers são meu feitiche desde que eu tenho 13 anos.

- Eu realmente imagino que você deveria ser mais um pobre e inocente garoto de 13 anos que olhava revistas pornôs e tocava uma no banheiro da escola. - a mulher se inclinou, segurando seu queixo delicadamente, com um sorriso zombeteiro no rosto.

- Isso foi aos 12. – ele sorriu automaticamente.

/ Liv.

Retratos. Sussurros.

Foi o som de um acorde. Violento. O rapaz ergueu a cabeça, olhando na direção da pesada porta de madeira e levantou-se da poltrona à frente da lareira de seu quarto. O que quer que estivesse fazendo não havia mais importância. Quieto, o rapaz se levantou e seguiu para fora do quarto. O violoncelo havia sido quebrado há anos... podia ainda se lembrar da briga.

Ao chegar no corredor, seus pés descalços e pálidos sentiram a frieza do piso de mármore. Havia uma fresta de luz... saindo da porta mais à frente. O quarto dela. O segredo dela. Uma fascinação, uma curiosidade, e também um desejo antigo remoeu-se dentro dele, insinuando-se quase polidamente... impeliram-no para frente.

Parou perto da porta, com uma das mãos apoiadas no vão da porta, ele inclinou-se apenas levemente para ver pela pequena abertura, de onde o som pesado e melodioso do violoncelo saía. Ele a viu. De olhos fechados, ela movimentava o arco sobre as cordas, os dedos rápidos e delicados produzindo as notas, e havia um leve contorcionismo no corpo dela, uma leve balançada como se a música lhe atingisse os músculos. Estava sentada, alvíssima, os cabelos longos e loiros pregados pelo suor em seus ombros, o vestido azul escuro mal lhe cobrindo as pernas. O violoncelo era negro e novo. Mais selvagem que o antigo.

A mulher abriu os olhos e encarou o rapaz diretamente. Os olhos azul cobalto também eram selvagens, reveladores, por um momento. Ele manteve-se quieto atrás da porta. O sorriso doce abriu-se em seus lábios. Um gesto tão incomum vindo dela. Aqueceu-o. Reconheceu o verdadeiro gênio da irmã naquele sorriso... era como um pequeno murmúrio, um “isso fica entre nós”. E com um leve aceno respeitoso, um sorriso quase imperceptível, ele assentiu, afastando-se dali.

/ Liv.